Espelho espelho meu, existe alguém
mais…? Em tempos de empoderamento
feminino (ODEIO essa expressão), a frase-ícone da história de Branca de Neve e
os sete anões pode soar anacrônica e até misógena, mas não há como negar: a relação íntima das
mulheres com o espelho permanece incólume através dos tempos. Ela pode até
oscilar entre o amor e o ódio, significar sinônimo de vaidade, pretender ser de
somenos importância, porém, nunca é pautada pela indiferença. Pelo menos, não para mim; nem para as mulheres
que conheço de perto.
Imagem Google |
O encontro com minhas amigas de
adolescência, semana passada, corroborou essa percepção. Já faz dois anos que nos reencontramos, depois
de quase quarenta sem contato; portanto, já ultrapassamos aquela fronteira dos
sustos do como éramos antes, perto dos vinte, e ficamos depois, passados os sessenta. Esses
sobressaltos hoje se limitam a nossas interações com os próprios espelhos. E há
quem, ainda assim, os minimize, como confessou uma das meninas – sim, entre
nós, ainda somos meninas – ao contar que não reforma o banheiro de casa de
jeito nenhum, porque há uma correlação “misteriosa” entre a cor dos ajulejos, a
iluminação do cômodo, e o velho espelho em uma das paredes, que a faz sempre
“parecer bem” na imagem que vê refletida.
“O espelho está tão velho, que as
bordas já estão até meio manchadas, mas tenho medo de trocá-lo e de não me
reconhecer refletida num novo”— comentou às gargalhadas.
Porque a verdade pode ser
surpreendente, emenda outra integrante do grupo, que já tem duas netas, e
afirma que toda avó perde qualquer senso critico, ao olhar o neto recém-nascido
no próprio colo.
“O bebê parece sempre ser a coisa
mais linda que você já viu na vida” – diz ela, contendo o riso antes de
continuar:
“Até o dia em que, por descuido ou
coincidência, a imagem se reflete num
espelho e você se pergunta espantada: quem é essa criança com cara de joelho?...”
Passado o ciclo das gargalhadas,
fiquei me lembrando de quantas, tantas, vezes eu mesma estranhei o que vi
refletido do lado de lá. O dia em que
cortei o cabelo no estilo pagem e tudo que consegui enxergar foi uma abóbora
usando franja. A vez em que congitei aderir à moda cigana, de vestidos florais
e cheios de babados, e sai correndo do provador da loja, ao constatar que os
modelos me transformavam em algo parecido com um abajur de puteiro. O momento
em que me dei conta de que o tempo estava passando: uma ruga no meio da testa,
a primeira, uma fenda no meio do caminho, vinte e cinco anos.
Mas antes que eu emburaque em
reflexões filosóficas, outra amiga do grupo conta como se confundiu com a própria imagem em um espelho de uma
pequena boutique, em Buenos Aires, na Argentina.
Ela se concentrou tanto em olhar as “zilhões de quinquilharias expostas no pequeno
espaço”, que ao chegar no fundo da loja, não se deu conta de que estava diante
de um espelho de corpo inteiro. Passou uns cinco minutos pedindo licença para
passar para o outro lado à imagem que
dançava em sua frente, achando ser uma mulher que vinha em sentido contrário.
“Só quando mexi na echarpe rosa com
a qual sempre viajo e vi o gesto se repetir do outro lado, percebi que aquela
moça – que eu estava convencida -- vinha na contramão, era EU!”
Sua irmã, que também faz parte do
grupo, confirma ter testemunhado e rido muito “desse esbarrão virtual”, junto
com a dona da loja. Entre brindes de espumante, acrescentamos nossas
gargalhadas ao relato quase surreal. Antes que alguém lembre de outra história,
pego o espelhinho de bolsa para retocar o batom. Ao mirar o reflexo dos meus
lábios pintados de carmim, lembro de um trecho da música-poesia de Arnaldo
Antunes, que diz assim: O buraco do espelho está fechado/ agora eu tenho que
ficar aqui/ com um olho aberto, outro acordado/ no lado de lá onde eu caí…
Eu e minha vocação para reflexões
filosóficas, mesmo quando o tom da conversa é hilário…
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Tell me magic mirror, is there anyone
else...? In times of women empowerment (I hate this expression), the iconic
phrase of Snow White's story may sound anachronistic and even misogynist, but
there is no denying that the intimate relationship of women with their mirror
remains unshaken through times. It may even oscillate between love and hate,
pretending to be of the slightest importance, but it is never ruled by
indifference. At least not for me, or for the women I know well.
Google's image |
The meeting with my teenage friends
last week corroborated this perception. It's been two years since we met again,
after almost forty without contact; therefore, we have surpassed that frontier
of scares of how we were before, near twenty, and how we became after the
sixties. These upsets today are limited to our interactions with our own
mirrors. And there are those of us who still minimizing them, as one of the
girls admitted - yes, among us, we are still girls - when she says she does not
remodel her bathroom at all, because there is a "mysterious"
correlation between the color of the tiles, the lighting of the room, and the
old mirror on one of the walls, which always makes her "look good" in
the image she sees reflected.
"The mirror is so old, the
edges are already half stained, but I'm afraid to change it and not recognize
myself reflected in a new one," she commented laughing.
Because the truth may be surprising,
another member of the group says. She, who already has two granddaughters, and
states that every grandmother loses any critical sense by looking at the
newborn grandchild in her lap.
"The baby always seems to be
the most beautiful thing you've ever seen in your life," she says, holding
back her laughter before continuing.
"Until the day when, by chance,
the image reflects in a mirror and you wonder: who is this child who looks like
a knee? ..."
When the cycle of laughter stops, I
remember how many times what I saw surprised me myself reflected on the other
side. The day I cut my hair to look like Romeo in Zefirelli’s Romeo and Juliet film
and all I could see was a pumpkin-wearing fringe. The time when I tried the
gypsy fashion of floral and full of ruffles dresses and run out of the store,
finding that the models turned me into something like a lampshade. The moment I
realized that time was passing: a wrinkle in the middle of the forehead, the
first, a crack in the middle of the road, twenty-five years.
But before I deep dive into dramatic
reflections, another friend of the group tells how her own image in a mirror of
a small boutique in Buenos Aires, Argentina, confused her. She focused so hard
on looking at the "zillions of trinkets on display in the little
space," that when she reached the back of the store, she did not realize
she was standing in front of a full-length mirror. She spent about five minutes
asking permission to step over the image dancing in front of her, thinking it
was a woman coming in the other direction.
"It was only when I looked at
the pink scarf with which I always travel and saw the gesture repeated on the
other side, I realized that I WAS the girl - who I was convinced - was coming
through the opposite side.
Her sister, who is also part of the 'girls group', confirms having witnessed and laughed a lot of "this virtual bump" along with the owner of the store. Among sparkling toasts, we add our laughter to the almost surreal story. Before anyone remembers another story, I pick up the pocket mirror to remake my lipstick. As I look at the reflection of my red lips, I remember a lyric by Arnaldo Antunes (*)', which roughly translated says: The mirror hole is closed / now I have to stay here / with one eye open, another awake / no side from there where I fell ...
Me and my vocation for philosophical reflections, even when the tone of the conversation is hilarious ...
(*) Arnaldo Antunes is a Brazilian poet and composer.
Her sister, who is also part of the 'girls group', confirms having witnessed and laughed a lot of "this virtual bump" along with the owner of the store. Among sparkling toasts, we add our laughter to the almost surreal story. Before anyone remembers another story, I pick up the pocket mirror to remake my lipstick. As I look at the reflection of my red lips, I remember a lyric by Arnaldo Antunes (*)', which roughly translated says: The mirror hole is closed / now I have to stay here / with one eye open, another awake / no side from there where I fell ...
Me and my vocation for philosophical reflections, even when the tone of the conversation is hilarious ...
(*) Arnaldo Antunes is a Brazilian poet and composer.
Gostei muito! Também dizer que, se às vezes o espelho me mostra esplendorosa e em outras me reflete caidaça, mudou nada com a idade! Sempre fui duas (pra não dizer várias )
ResponderExcluirAdorei o conceito da multiplicidade independente da idade ! :--))
ExcluirEste comentário foi removido por um administrador do blog.
ResponderExcluirNós no espelho... Kkkkkkkkk!!😂😂😂
ResponderExcluirDefinitivamente, nós :--))
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