Quem sou eu

sábado, 7 de outubro de 2017

Emoção à flor da pele / Emotionally frazzled


“Ando tão à flor da pele, que qualquer beijo de novela me faz chorar” . Tomo emprestado o verso da canção de Zeca Baleiro, para expressar o estado de espírito que vem pontuando meus dias. Um misto de frustração e desalento que   me assalta, toda vez que acompanho os absurdos do noticiário.. Uma  combinação de aflição e cansaço que me faz refém da incongruência de fatos consumados. Chacinas delirantes, arrastões desarvorados, tiroteios insones,  estupros com requintes de tortura. Apelos desesperados de pais, mães, filhos, avós -- todos orfãos. Todos vítimas dessa guerra espetaculosa, que, além de deixar uma trilha de cadáveres e corpos mutilados, enche as ruas com a estupefação dos endividados, dos  desempregados, dos esfomeados.

Imagem Google
Convivo com esse mosaico de manchetes sangrentas como quem ainda não foi contaminada pela peste que assola um território. Sempre em sobressalto. À espera e à espreita do momento em que também serei atingida e engordarei uma dessas estatísticas tenebrosas. O permanente estado de alerta de quem sabe que, numa situação de calamidade, o privilégio da imunidade tem seus dias contados. Não adianta erguer muros, ou expulsar deformados – tombaremos todos.

E é essa consciência que, paradoxalmente, também me enche de esperança. Saber que a mesma sina está reservada aos que comandam a ordem do dia com seus mandos e desmandos. Acreditar que a determinação da maioria – mesmo que, momentaneamente, silenciosa --  será mais forte e resiliente para derrubar essas agendas pautadas pela incompetência, pela truculência, por interesses espúrios, ou tudo isso junto e misturado. A idade me dá essa confiança; essa sensação de já ter visto este filme antes.  

É verdade que o tempo, muitas vezes, tarda, se alonga muito além do que consideramos suportável. É verdade também que, outras tantas, aquilo que parece ser é tão bom, que vira causa e a ela aliamos nossas esperanças e disposição.  Até que esmaeçem: as causas revelando suas verdadeiras intenções; nossa crença e energia transmutando-se em desilusão.  São os equívocos que todos que escrevemos história (s) cometemos. São os acidentes de percurso, não o destino final.

Porque esse destino, eu sei, eu sinto, mora em algum lugar ensolarado, emoldurado por muito verde e águas cristalinas. Algum endereço abundante em sombreados para refrescar as tardes; profícuo em silêncios para embalar as sestas e despertar cada palavra que precisa ser ouvida. É o chamado lugar ao sol, que tanto almejamos e buscamos. O lugar que, por direito, pertence a cada um de nós – esse cada um que forma todos. O lugar que, de fato, precisamos tornar nosso, para que a ele possamos pertencer, sem as amarras da desconfiança, sem a cegueira da intolerância.

O lugar que um certo escriba garantiu: em se plantando, tudo dá; e que, muitos anos depois, um hino, ouvido às margens plácidas de um certo rio, definiu como pátria amada, idolatrada!  Um lugar que um poeta, que não era gauche na vida, afirmou ter palmeiras onde canta o sabiá e que outro, diplomata, chamou apenas de pátria pobrinha, pátria minha – patriazinha. Um lugar ao qual o maestro e o bardo, em seus exílios, sabiam: voltariam. Voltariam para ouvir cantar as aves que só aqui gorjeiam como em nenhum outro lugar.

Que Caminha, Osório Duque-Estrada, Bilac, Vinícius Tom e Chico me perdoem, mas todas as minhas palavras são poucas para descrever o que vocês, inspiradamente, cantaram em versos. Os versos com os quais cresci, que tanto declamei em saraus e tentei plagiar nas minhas veleidades literárias. Os versos que tatuei na alma, porque me serviram de bússola quando me ensinaram o sentido de pertencimento. Os versos que hoje podem estar até calados, mas cujas métricas despertam com o pulsar dos corações esperançosos como o meu. E se a onomatopéia me permite, aí vai o que o silêncio encerra:

Pum-bum! Pum-bum! Pum-bum!

Será só o meu coração ou há também panelas batendo ao longe?

……………………………………………………………………………….
Se você gostou deste post, por favor, o compartilhe com sua rede de relacionamentos, clicando em um dos botões que aparecem no rodapé da tradução em inglês abaixo. Se deseja, a partir de agora, receber notificações dos novos posts do blog no seu próprio email, preencha o requerimento no espaço-retângulo logo abaixo do meu perfil, na coluna à direita deste artigo.
……………………………………………………………………………….

I have been so emotionally frazzled, that even a cheesy soap opera love scene makes me burst into tears. Even roughly translated with my friend, Patricia Hausberg’s help, these lyrics still belonging to Zeca Baleiro’s song (*) and I borrow them to describe my last days’ mood.  It has been a mix of frustration and sorrow that prevails every time I follow the news; a combination of fear and exhaustion that makes me a hostage of unbearable facts. Murders, assaults, robberies, rapes. Desperate appeals from fathers, mothers, kids, grandparents – all of them orphans. Victims of this broadcasted war that leaves a trial of corpses and mutilated bodies and fill the streets with in debt, unemployed, starving people.

I live with this mosaic of bloody headlines as those who, living in a place contaminated by a plague, have not been infected yet. Someone who is always in alert, waiting for the moment when one of those tragedies will impact her/his life.  Someone who permanently stays awaken, because she/he knows that the privilege of being immunized does not last when everyone around is not. You can build walls, you can deport deformed people, but nothing of that will work out – we all will be defeated.

Paradox or not, this is what also makes me hopeful. Because I know the same fate is reserved to the ones who currently own the agenda. I believe that what is right for the majority will be stronger and more resilient than the incompetency, the truculence and unethical interests that now guide the ones in charge. It is true that, many times, the right time seems to be delayed (more than what we consider bearable) and that the causes that seem to be right disappoint us. Those are the mistakes that all of us make when writing history/stories. They are accidents not the ultimate destiny.


This destiny – I know, I feel – lives somewhere in a sunny place, surrounded by green forests and crystalline waters. Some quiet place rich in shades to refresh and lull afternoon naps, to offer the silence voices that are begging to be heard need. It is the sunny side we all dream of. The place that, by right, belongs to all of us and, in fact, we need to make ours. It is the only way to build a sense of belonging that prevails over the current mistrust and intolerance.


3 comentários: