Talvez porque já seja quase Natal e 2018 já esteja logo ali. Talvez porque essa época do ano me deixe mais sensível do que de costume, um tanto melancólica – quase sentimental. Talvez porque esse misto de emoções me remeta ao encantamento de ir à feira com minha mãe, escolher nosso pinheirinho, para depois tranformá-lo na nossa árvore natalina, num ritual quase religioso que todas as palavras são poucas para descrever. Talvez por conta de tudo isso (junto e misturado :--), eu me veja aqui ensaiando uma carta para Papai Noel.
Imagem Google |
Foi quase por acaso que minha certeza evaporou como bolhas de sabão. Numa antevéspera de Natal, na casa da minha madrinha e Tia Dudu onde passávamos todos os Natais (ja mencionei esses Natais em outros posts), entreouvi uma nesga de conversa entre minha prima mais velha, Ana, e a mãe, em que, referindo-se a Papai Noel, a prima adolescente dizia:
“ Alguém precisa contar a verdade a Verinha, ou ela vai acabar sabendo da pior maneira possível”.
Não precisei ouvir a resposta cheia de ‘mas mas’ da minha tia, para entender que havia sido enganada todos aqueles anos. Para experimentar a humilhação de ter acreditado tão piamente em alguma coisa que não existia. Para sentir o gosto, que muitos anos depois e guardadas as devidas proporções, entenderia: era o sabor acre e indigesto da traição. Para ver o que eu entendia como confiança reduzido a cacos – a cacos de cristal, impossíveis de colar.
Sei que estou parecendo melodramática, mas o que posso fazer? Eu me sentia mesmo assim: devastada. De uma tal forma, que me escondi no fundo do quintal para chorar. Chorar por ter sido boba e ter me negado a enxergar o que tantos a minha volta apontavam. Chorar por ter aceitado as evasivas adultas em reação às minhas tentativas de tira-teima, por causa do temor de me decepcionar. Chorar por ter depositado tanta esperança nas longas cartas que eu endereçara ao ‘bom velhinho’ a partir do momento que aprendi a escrever e que, a partir daquele instante, eu sabia: não existia. Aonde teriam ido parar aquelas cartas?
Foi no meio de todo esse desconsolo e com a cara inchada e vermelha de tanto chorar, que meu padrinho e tio Leo (também já falei sobre ele em outros posts) me encontrou, ao dirigir-se ao galpão no fundo do quintal em busca de uma ferramenta. Ficou tão desconcertado ao me ver naquele estado, que não disse nada; apenas sentou-se no chão ao meu lado, debaixo da goiabeira. Não sei quanto tempo ele ficou ali, em silêncio, escutando os meus soluços, esperando que as lágrimas se esgotassem e eu me dispusesse a falar. Pra mim, foi uma eternidade, mas ele respeitou o meu tempo.
E ele nem precisou fazer perguntas. Quando, finalmente, consegui articular o que estava sentindo, as palavras surgiram aos borbotões; vociferando toda a minha raiva, toda a minha decepção, toda a vontade que eu tinha em voltar no tempo e apagar aquele fato da minha vida (de apenas uma década, mas que naquele momento parecia o que eu vislumbrava como ter cem anos!). Entre uma frase e outra, eu batia na mesma tecla:
“E as cartas que escrevi ao Papai Noel? Aonde foram parar as cartas?!!!!!!
Assim como os soluços, as palavras também esgotaram. E meu tio, com a sua paciência amorosa, esperou pelo silêncio. Quando se certificou de que ele não seria mais interrompido por nenhum outro rompante, me deu a mão e, ali, sentado sob a goiabeira, me contou que, muitos anos antes, quando lhe contaram a verdade sobre Papai Noel, sofreu tanto, que teve febre durante três dias e passou outros tantos sem comer. Perambulava inconsolável pela casa e, assim como eu, também só se perguntava o que havia sido feito das suas cartas natalinas e de tudo o que havia depositado nelas. Até que, numa noite, acordou com uma rena batendo no vidro da janela do seu quarto. Ela tinha vindo convidá-lo para visitar o bom velhinho. Ele estranhou e reagiu disparando a verdade: “Papai Noel não existe!”. Ao que a rena refutou:
“Você está enganado, Leo. Papai Noel existe sim. Existe na nuvem cor-de-rosa da imaginação das crianças”.
Ele pulou da cama sobressaltado e viu que havia sonhado. Muitos anos depois, encontrou tanto conforto naquele sonho, que incorporou a tal nuvem cor-de-rosa ao resto da sua vida. Não só para abrigar Papai Noel e explicá-lo a seus próprios filhos, mas também para alimentar o seu olhar de menino, a sua alegria e disposição para continuar soltando pipa com a garotada, a sua sensibilidade para não deixar uma menina inconsolável, mesmo que fosse por ‘uma bobagem’, como poderia parecer a muitos. Ainda que ela fosse um pouco difícil de convencer e não parassse de perguntar:
“Mas e as cartas, Tio Leo?!!!! O que foi feito das minhas cartas de Natal?!!!!”
Tudo bem que Papai Noel pertencesse a esse universo de nuvens cor-de-rosa, que só dependia da minha imaginação acreditar ou não na sua existência e que eu não precisava me sentir melhor ou pior que ninguém ao optar pela crença. Tava tudo certo. Bacana. Mas eu queria saber das minhas cartas!!!!
“O que foi feito das cartas que escrevi a Papai Noel, Tio Leo?”
Meu tio não se intimidou por não ter uma resposta mágica (como a da nuvem cor-de-rosa). Apenas disse que não sabia o que havia sido feito das cartas que eu escrevera até ali. E afirmou que, na verdade, isso também não importava, porque o que realmente contava eram as cartas que eu passaria a escrever dali pra frente.
Acho que vem daí o meu gosto pela prosa. Esse prazer de escrever relatos, como se endereçasse missivas a mim mesmo, como se construísse pontes para, ao me reconhecer no destino, poder chegar ao outro. O prazer que -- hoje sei -- descobri lá atrás, através daquelas cartas natalinas que até hoje não sei onde foram parar. O prazer que meu tio Leo não deixou que morresse com a ilusão de Papai Noel.
Como ele, meu tio, não está mais aqui para que eu possa agradecer o tesouro que me possibilitou guardar, faço deste post a minha carta de Natal:
“Querido Papai Noel, …”
Ou seria?:
“Querido Tio Leo, neste Natal de 2017, não importa que nuvem cor-de-rosa você habite, …”
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Maybe because it is Christmas and 2017 is already around the corner. Maybe because the holidays season makes me feel more sensitive, a bit melancholic, almost sentimental. Maybe because this mix of emotions refers to that unique enchantment of choosing and decorating the Christmas three with my mom. Maybe because of all of these things together, I find myself drafting a Santa Klaus’ letter.
I know. It has been a while I know Santa does not exist. And I remember my disappointment when, at ten, I discovered the truth, regardless of the fact my older friends had whispered it on my ears so many times and adults, including my parents, had always smiled evasively whenever I tried to ask them the question. Those evidences were not enough.
It was almost by chance I had to face the reality. I was at my aunt Dudu’s home for the family Christmas celebration (I have mentioned these gatherings in a former post), when I, not on purpose, heard her conversation with Anna, my oldest cousin. Referring to Santa Klaus, Anna simply warned her mother:
“Someone needs to tell Verinha the truth or she will discover it through the worst way possible”.
I did not need to listen to my aunt’s full of buts answer to conclude people had lied to me all those years and to feel humiliated, disappointed, disregarded. To see the trust I had in them falling apart, as a broken crystal vase you will never pull together again.
I know this maybe seen as too much drama, but what can I say if I really felt devastated? If I felt so miserable, that I hide myself at the bottom of the backyard where nobody could find me to cry. I simply needed to cry. I had to cry for being a fool who had ever denied evidences. I had to cry for writing so many letters to Santa, sharing my dreams, sharing my hopes. Where, to whom those letters had gone?
My uncle Leo (about whom I have also written in this blog) found me in the middle of this sorrow, when he headed to the tools house at the furthest end of the backyard. He got so embarrassed in seeing me weeping and sobbing that he did not say a word; he simply sit besides me below the guava. I do not know how long he stayed there silently. I only know that when I stopped crying he was there to listen to all I had to vent. And there he stayed till I got tired and shut up. Then, he held my hand and started telling me how much he also suffered when, many years before, he discovered the truth about Santa. He got a fever, did not eat for three days and, like me, did not stop asking about the letters he had addressed do ‘the old man’. Till the night he woke up with a reindeer knocking at the window to invite him to visit Santa. He immediately said Santa Klaus did not exist and heard back from the reindeer:
“You are wrong, Leo. Santa does exist. He exists in the pink cloud of children’s imagination”.
He later realized that the conversation had been a dream. But the point is it made him feel so comforted, that he decided to incorporate that pink cloud to his life. He made that decision not only to house Santa, but also to preserve his boyish glare and keep his sensibility sharp enough to comfort a little crying girl who was suffering for something many adults would define as silly. Even though this girl was not easy to convince and kept asking:
“What about my letters, uncle Leo?!!!! What was made of them?!!!!”
My uncle did not feel intimidated by his lack of a magical answer. He only said he did not know about the letters I had written till then and that, actually, he was not concerned about them. He said his worries regarded the letters I was up to write from that moment on.
Today I know he discovered my writing gift before I could be aware of it and made what he could to keep it alive regardless of my disappointment with the truth about Santa. As uncle Leo is not around anymore, I cannot thank him. I can only write this post in his memory as a Christmas letter. So, here it goes:
“Dear Santa…”
Or should that be:
“Dear Uncle Leo, this is 2016 Christmas and no matter where is the pink cloud you now live in…”
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Eu adoro Papai Noel. Quem disse que ele não existe?!
ResponderExcluirAinda hoje mesmo com meus 63 anos acredito na magia do Papai Noel;época em que nos tornamos mais sensiveis e consequentemente mais humanos.Minhas cartinhas ainda são escritas embora eu nunca as remeta.Afinal ainda não descobri o endereço da Nuvem Rosa.
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