Quem tem mãe não tem
medo.
Aos 25 anos, quando ouvi
essa afirmação pela primeira vez, ela soou mais como frase de efeito do que
como máxima que realmente fizesse sentido pra mim. Proferida pela minha xará
Veralu Andrade sempre que vencia um novo desafio, a expressão foi se
incorporando às conversas do dia a dia e se transformando numa espécie de
mantra, na pequena redação onde trabalhamos juntas, na década de oitenta. Era
um tal de recitar quem tem mãe não tem medo pra lá e pra cá, que eu mesmo
passei a fazê-lo, quase que automaticamente, toda vez que precisava enfrentar os
típicos perrengues da minha rotina de jovem repórter.
Minha mãe, D. Lydia, aos quase 93 anos |
Foi com o passar do
tempo e a superação de perrengues que transcenderam o universo profissional,
que fui entender a profundidade da frase. Na verdade, precisei de alguns
(muitos) anos no divã do analista para realmente compreendê-la. Para perceber que
o meu destemor e a minha determinação diante da vida não haviam nascido numa
chocadeira; que a minha sensibilidade vinha de uma base sólida de afeto; que o
meu excesso de autossuficiência era só disfarce para quem, precocemente, trocou
a proteção do colo materno pelos sustos da vida adulta.
E como era bom aquele
colo! Morno, macio, rescendendo a jasmim. Sempre me acolhendo na volta das
brincadeiras infantis: ‘Batatinha frita um, dois, três! Mamãe posso ir? Quantos
passos?!...’ Sempre pronto para se transformar em cuidados para os meus joelhos
permanentemente esfolados: água oxigenada, tintura metiolati e sopradinhas para
aliviar a ardência antes de colocar o bandeide sobre o machucado.
Como era bom aquele
colo! Rijo, sólido, permanente. Sempre disponível para abraçar meus
desasossegos adolescentes, ainda que mal alcançasse o que, para mim, só Clarice
Lispector era capaz de traduzir: “Eu não caibo no
estreito, eu só vivo nos extremos. Pouco não me serve, médio não me satisfaz,
metades nunca foram meu forte!”… Ah! Aquele
abraço! Terno, caloroso, apertado. Sempre dando boas vindas às minhas fortuitas
visitas adultas. Sempre disposto a se transmutar novamente em colo, berço,
acalanto.
Quanto
tempo levei, mãe, para me dar conta de que seu colo é chão, é raiz, é alicerce.
Quanto tempo precisei para me reconhecer na sua semelhança, apesar das
diferenças. Quanto tempo demorei para voltar pra casa, me sentir em casa, e me
reencontrar na casa que cheira a café com leite e pão torrado ao
amanhecer. Ainda bem que deu tempo, mãe.
E que hoje, aos quase sessenta anos, eu tenha a felicidade de ainda poder dizer
– agora com convicção: quem tem mãe não tem medo.
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Who has a mother is never afraid.
At
age 25, when I first heard this statement, it sounded more like a catch phrase
than something that really made sense to me. Delivered by my friend Veralu
Andrade, whenever she faced a new challenge, the expression was incorporated
into our daily conversations and became a kind of mantra in the small newsroom
where we worked together in the eighties.
I
only understood the depth of the phrase after many years. In fact, I needed
time on the analyst's couch to really understand it. To realize that my
fearlessness and my determination had
not been born in a brooder; that my sensitivity came from a solid foundation of
affection; that my excess of self-sufficiency was only a disguise for those
who, early on, changed the protection of their mother's lap for the scares of
adult life.
And
how good was that lap! Warm, soft, resembling jasmine. Always welcoming me in
the return of children's games. Always ready to take care of my permanently
skinned knees: hydrogen peroxide, tincture methiolate and blows to relieve the
burning before placing the Band-Aid on the bruise.
How
good was that lap! Solid and permanent. Always available to embrace my adolescent
restlessness, although it barely reached what, for me, only Clarice Lispector (*) was able to translate: "I do
not fit in the strait, I only live in the extremes. Little does not suit me,
medium does not satisfy me, and halves have never been my gift! "... Ah!
That hug! Suit, warm, tight. Always welcoming my random adult visits. Always
willing to transmute again in lap, cradle, and lull.
How
long it took me, Mom, to realize that your lap is ground, it's root, and it’s
foundation. How long did it take me to recognize myself in your resemblance,
despite the differences. How long it took me to come back home, feel at home,
and find myself in the house that smells like coffee with milk and toasted
bread at dawn. I am glad I could make it in time, Mom. And that today, when I
am almost sixty years old, I still can say - now with conviction: who has a
mother is never afraid.
(*) Clarice Lispector is a Brazilian writer.
Tive um pouco disso no final...foi bom. 😁
ResponderExcluirQue bom, Ju. É muito bom voltar pra casa e ficar em paz.
ExcluirSempre nos emocionando, né Verinha!
ResponderExcluirVocê está dizendo, Dibbbah :) Que bom que as minhas emoções falam com as suas.
ExcluirEterno amor entre filha e mãe.
ResponderExcluirPor favor, dê um longo abraço na sua mãe e diga a ela que é de uma amiga gaúcha pelo dia das mães.
Foi bem dado, Carmo :--)))
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