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sábado, 15 de outubro de 2016

Para Sempre Jovem / Forever Young

“A vida não permite ensaios. É um plano sequência que passa uma só vez. Não deixem nada nem ninguém  amargurar  a vida de vocês”.

A frase proferida pelo ator Marcos Tumura, no encerramento do musical ‘Forever Young’ (Para sempre jovem (*),  soa como um alerta e convida à reflexão, diante do que a vida oferece como destino inexorável a todos que não morrem jovens: a velhice.  É dela que a peça trata, sem lançar mão das maquiagens retóricas que constantemente tentam disfarçar o que significa envelhecer com todas as letras.  Dela e da sua inerente vulnerabilidade, que  limita, constrange, irrita e pode tornar-se insuportável, se não aprendemos a rir de nós mesmos.  Uma prática que o espetáculo de duas horas nos induz a exercitar, apesar da decrepitude em cena.

Musical 'Forever Young', em cartaz até 30/10, em SP
Confesso que, sem conseguir conter o choro em muitos momentos, dei boas gargalhadas. Ri e chorei, ao reconhecer no palco muito da realidade vivida pelos meus pais nonagenários (escrevi sobre eles aqui no blog, no post ‘Meus pais, meus filhos’). Ri e chorei, ao identificar nos personagens teimosias, ranzinzices e devaneios que, provavelmente, repetirei, se eu viver até 2050: situação hipotética proposta pela peça. Ri e chorei, porque, se a vida imita a arte -- ou seria ao contrário?!... Ou ambos?! --, encerrarei minha jornada em um asilo e, sendo assim, faz-se necessário colocar esse tema em discussão na pauta da minha agenda de futuro.

Começo, então, aqui. E me desculpem se o assunto é árduo, árido, difícil de digerir – ele também não é fácil pra mim. Mas como filha única de pais idosos, parceira de um companheiro quinze anos mais velho, sem filhos, e com a chance de viver mais trinta anos, acho pertinente me perguntar:  e quem vai cuidar de mim?!!!!!  De mim e do Péricles, o jabuti setentão que passou a ser membro da minha família, há 14 anos,  a partir do casamento e  que,  provavelmente,  será o único a ainda estar por aqui em 2050…

Eu sei, eu sei: não há qualquer certeza de que as coisas transcorrerão dessa forma. Nada garante que daqui a cinco minutos, antes mesmo que termine de formular este post, eu… Caput! Desculpem novamente, mas a onomatopéia é a única forma que me ocorre, para expressar o segundo em que o lampejo da vida se apaga e para tentar fugir da cafonice desse clichê que acabei de escrever.  Mas como todo mundo tem um lado B, de brega mesmo, conto com a benevolência, também com B, de vocês, para aceitar essa minha permissividade de estilo, na tentativa de não parecer mórbida.
Péricles, o jabuti senior, que hoje tem 70 anos
Breguices consideradas, sempre assumi as minhas: chorar com comercial de margarina na TV; ler/devorar romances água com açúcar; gostar do Wando e do Sidney Magal, com seu repertórios erotizados --  …”Meu iaiá, meu ioiô!”… “O meu sangue ferrrrrve por você!”…  -- Rs Rs Rs. Acho que só perco mesmo para um colega de trabalho que, anos atrás,  numa disputa sobre quem teria o lado mais B, confessou não resistir ao apelo gastronômico (ou seria de gula duvidosa?!) daqueles ovos cozidos com casca cor-de-rosa, encontrados em balcões-vitrine de botequins pé –sujo.

Mas voltando ao que poderá anteceder o meu Caput.  Ainda que eu tivesse filhos (e não me arrependo de não tê-los, leiam as razões no artigo que escrevi para o site Mulheres50+ -- mulherescinquentamais.com.br), não seria feliz ao ter minha existência pesando sobre suas costas. E este é um fato que precisa ser encarado sem romantismos: a velhice pesa. Mesmo quando acontece em um cenário saudável, ela pesa. Pesa, porque restringe nossa capacidade física;  pesa, porque exige cuidados de prevenção e monitoramento da saúde que, num país  marcado pela precariedade do SUS, são onerosos; pesa, porque, se ainda lúcidos, temos a consciência da progressão das limitações e da dependência que ela causa. E, sobretudo, porque não estamos preparados para lidar com nada disso. Ninguém antecipa, ninguém conta, ninguém ensina.

É nesse aspecto que a peça  ‘Forever Young’ assume um caráter educativo e, também por isso, toca tanto. Ela retrata, sem medo de às vezes ser até politicamente incorreta, a convivência de seis octagenários em um asilo e sua resistência a quem tenta lhes tirar o prazer que ainda tem na vida. Mostra, sem retoques, a rotina de um grupo de velhos – v-e-l-h-o-s, sim, com todas as letras! É preciso não ter medo de usar a palavra que nos definirá a todos, se lá chegarmos --,  com suas manias, idiossincrasias,  incontinências e ausências. Condições que não podem ser corrigidas com recursos de fotoshop, mas que podem, sim, ser relatadas e enfrentadas com humor e um quê de rebeldia.

No musical, a narrativa é pontuada por piadas e pela cadência contagiante do rock'n'roll, sempre acompanhadas pelos risos e aplausos da plateia. Na vida, há que encontrar a sintonia precisa para encarar o desafio. Mas se a vida imita mesmo a arte --ou seria o contrário?!... Ou ambos?! --, essa busca passa por dedicar tempo --  hoje já, aqui e agora --, para aprender a rir de si mesmo e para escolher a trilha sonora que melhor e, alegremente, preencha nossos lapsos de memória. A que me acompanhará ao asilo onde viverei, se chegar aos oitenta, seguramente, terá a música 'Forever Young' na play list. Junto com todas as do Wando e do Sidney Magal, claro :) . 

(*) A peça ‘Forever Young’ está em cartaz, de sexta a domingo,  até o dia 30 de outubro, no Teatro Raul Cortez , em São Paulo. Ao encerrar a temporada paulistana, viajará pelo Brasil e estreará no Rio de Janeiro, no início de 2017. 
(**) Ouça a música "Forever Young' no YouTube https://www.youtube.com/watch?v=t1TcDHrkQYg

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“Life is no dress-rehearsal. You live it all in one shot. So, don’t let anyone harm it”.

The actor Marcos Tumura’s sentence at the end of the musical ‘Forever Young’ (*) alerts and invites us to think about the fate everyone who does not dye young will share: aging. The subject is approached by the play without the tricks commonly used to disguise old age real meaning and its embedded vulnerability. A condition that restricts embarrasses and irritates, if we do not learn how to laugh at ourselves. And this is the exercise the play induces us to practice, regardless of the decrepitude we see on stage.

I confess I bursted out laughing and crying during the two-hour show. I laughed and cried, because I recognized on stage the reality my old parents are facing (have talked about it on a previous post “My parents, my kids’). I laughed and cried, because I identified in the characters the stubbornness and irritation that I will probably will repeat, if I live till 2050 (the hypothetical situation proposed by the play). I laughed and cried, because if life emulates art – or is it the opposite?!... Or both?! – I will finish my journey in a shelter; then, sooner or later, need to include the topic on my discussion list.

So, let me start here.

Forgive me if the topic is dry and hard to digest (it is not easy for me either). But as the only daughter of a very old couple, the wife of a fifteen year older husband, having no kids and the chance of living more thirty years, I think it is natural to ask the question to myself: who will take care of me when I get there?! Of me and of Pericles, the seventy year turtle who became part of my family, fourteen years ago when I got married, and probably will be the only one to last till 2050…

I know, I know: we cannot be sure things will happen that way. There is no guarantee I will not CAPUT! Before finishing to write this post. Sorry for the onomatopoeia, but it is the only way I am finding to avoid using clichés. So, back to my question. Even if I had children (and I do not regret not having them), I would not feel happy in being a burden to them. And this is something we need to face: getting old impacts our lives. Even when it happens in a healthy scenario, it is impactful. And it is so, because it imposes physical limitations, because it demands expensive care (mainly in a country like Brazil) , because if our minds still clear, we are aware of how these limitations progress. And we are not prepared to deal with all of that. Nobody tells or teaches us.


In that sense ‘Forever Young’ is educational. It shows how six octogenarians get along with each other in a shelter, despite of their manias, obsessions or absences. And it does that without fearing to be politically incorrect – a needed approach to portray the reality and face it with humor and a bit of rebelliousness. On the stage, the narrative is highlighted by jokes and rock’n’roll. In life, we need to find the right tone and tunes. But if life emulates art – or is it the opposite?!... Or both?! – We need to dedicate time, now and immediately, to learn how to laugh at ourselves and to choose the soundtrack that will fulfill our lack of memory.    

8 comentários:

  1. Como dizem por aqui "Life is no dress-rehearsal" e a verdadeira idade se revela na nossa atitude frente a vida. Em relacao a nao ter familia ou filhos, ha muito tempo que a tradicional familia nunclear deixou de existir. Pais, filhos, e outros parentes hoje vivem distantes uns dos outros fisica e mentalmente ... Na minha opiniao os amigos passarao a ser a nova familia e rede de apoio da maioria das pessoas. Como isso vai se traduzir nos estagios adiantados da velhice sera definido por nossa geracao.

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    1. Cyber, concordo plenamente com você. Só acho que para dar conta dessa tarefa geracional temos que começar a pensar nisso agora. Quem sabe o 2XTrinta no futuro não vira um condomínio para moradoras de 2x40, 3X30?! :--D

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    2. To dentro! Let's plan the "next steps" :-D

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  2. Eu também vou pro asilo, se viver tanto. Vou começar a preparar minha playlist!
    Quem sabe a gente num vai pro mesmo e ouviremos Sidney Magal com Pericles? ;)

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    1. Se o seu bom gosto musical acolhe meu lado B, tô dentro. Em tempo, só pra lembrar: eu também gosto de Caetano, Gil, Pixinguinha, Cartola, Beatles e Rolling Stones :--D

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  3. Concordo com o que disse a Patrícia, os amigos serão nossa família e, por isso, é importante cultivá-los agora e sempre. Parabéns Vera!

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    1. Inspirada na Patrícia, eu já estou abrindo hipotéticas inscrições para interessados no hipotético empreendimento residencial ' 2xTrinta -- vida hipotética depois dos 80'. Se estiver interessada, Andrew, é só subscrever a lista. Nesse condomínio, gatos, cães e demais pet serão muito bem-vindos.

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