Quem sou eu

sábado, 24 de junho de 2017

Dentro de um abraço / Inside a hug

O melhor lugar do mundo é dentro de um abraço, canta Jota Quest, enquanto tento sintonizar o rádio do carro na estação que só veicula notícias.  Presa num desses engarrafamentos que fazem parte do cotidiano paulistano, me permito um break na busca do noticiário e presto atenção à letra que afirma: tudo que a gente sofre num abraço se dissolve…

Instantaneamente, penso que, ao contrário do beijo, não existem abraços roubados.  Imediatamente, começo a lembrar dos abraços que já dei e dos tantos que já ganhei. Lembro também daqueles que pedi e não recebi; e principalmente dos que neguei. Penso nas vezes em que quis abraçar e não abracei, porque não ficava bem (o que os outros vão pensar?); porque, eu tinha certeza: o outro não entenderia; porque tive medo – muito medo mesmo, do que aconteceria depois de ter o abraço correspondido.  

Às vésperas de completar sessenta anos, esses balanços afetivos se tornaram mesmo uma rotina.  Uma rotina que não instituí deliberadamente, mas que me pega, assim de repente, na quebrada de qualquer esquina em que topo com uma nova, velha,  inusitada, quase esquecida, requentada -- não importa -- emoção.  E aqui estou eu, agora, engarrafada em plena Avenida Paulista, às seis da tarde,  resgatando abraços, por causa dessa música que diz que dentro deles é sempre quente.

Nem sempre, se considerarmos o abraço dos afogados, que nos faz afundar e visitar subterrâneos onde não há oxigênio, mas que é  necessário conhecer para que reaprendamos a respirar. Às vezes, se levarmos em conta os abraços de tamanduá, que nos tritura ossos e alma num só amplexo, para que aprendamos a distinguir o joio do trigo -- a identificar quem genuinamente apenas quer nos abraçar.

Porque há abraços e abraços. Só no dicionário, há os que nos tomam entre os braços, os que nos rodeiam, os que nos adotam, abrangem, admitem sem relutância e nos entrelaçam. Na vida, há nuances que não cabem no léxico, como: o abraço de lençóis levemente perfumados, que exala os cheiros da infância vivida e dormida nas camas dos pais, avós,  tios e padrinhos queridos; o abraço coletivo, literal e adolescente, em que, qual os três mosqueteiros e D'Artagnan, somos um por todos e todos por um; o abraço da quase penumbra do divã do analista,  onde tudo é confessado e perdoado à priori, porque não há julgamentos; o abraço dos parceiros, quase almas-gêmeas, que assim se reconhecem, depois de longas caminhadas solitárias; o abraço dos amantes traduzido pelo ritmo do tango,  essa dança-amplexo de pernas e braços, que demanda paixão para que não se erre os passos.

‘Siempre que te pregunto que, cuando, como y donde, tu siempre me respondes quizas, quizas, quizas’… (sempre que te pergunto o que, quando, como e onde, você sempre me responde: quiçá, quiçá. quiçá?!...)

Porque há abraços e abraços. E sobretudo há o que não sabemos sobre os abraços que negamos, sonegamos e dos quais desviamos. Sem falar dos  que escondemos e daqueles que prometemos, mas não demos.  E como não há abraços simulados, provavelmente ficaremos sem redenção diante de quem abraçamos sem vontade. Principalmente porque os verdadeiros abraços ficam para sempre tatuados no peito e na alma da gente. Ficam gravados em tinta incandescente, num quase mosaico transparente a olho nu, mas que neste momento se acende, porque são seis horas da tarde, o trânsito está parado na Avenida Paulista, e, no rádio, Jota Quest canta. Ele canta e eu faço coro, por conta de todos os abraços que ainda darei e receberei: o melhor lugar do mundo é dentro de um abraço.
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The best place in the world is in a hug, sings Jota Quest (*), while I try to tune the radio in the news station. Caught in one of those traffic jams that are part of daily life in São Paulo, I give myself a break in the search for news to pay attention to the lyrics that say: everything we suffer is forgotten in a hug...

Instantly, I think that, unlike the kiss, there are no stolen hugs. Immediately, I begin to remember the hugs I have given and the many that I have won. I also remind myself of the ones I have denied and of the times when I wanted to hug and I did not, because I was worried about what others would think; Because, I was sure: the embraced person would not understand it; Because I was afraid - very much afraid, of what would happen after having the corresponding hug.

On the verge of turning sixty, these affective balances have become a routine. A routine that I did not set up deliberately, but that suddenly catches me at any corner where I bump on a new, old, unusual, almost forgotten, reheated - no matter - emotion. And here I am, now, jammed in the middle of Avenida Paulista, at 6.00 pm, rescuing hugs, because of this song that says that inside them it is always warm.

Not always, if we consider the drowneds’hug, that makes us sink and visit subterranean where there is no oxygen, but that are necessary to teach us how to breath properly. At times, if we take into account the bear’s hug, which smashes our bones and soul all together, so that we learn to identify whom genuinely just wants to hold us.

Because there are hugs and hugs. Only in the dictionary there are those, which take us in their arms, adopt, embrace, admit without reluctance, and entwine us. In life, there are nuances that do not fit in the lexicon, such as: the embrace of lightly perfumed sheets, which exudes the scents of childhood lived and asleep in the beds of parents, grandparents, uncles and dear godparents; The collective, literal and adolescent embrace in which, like the three Musketeers and D'Artagnan, we are one for all and all for one; The embrace of the shirker’s coach, where everything is confessed and forgiven beforehand, because there are no judgments; The embrace of the partners, almost soul-mates, who thus recognize themselves, after long lonely walks; The lovers’ hug translated by the rhythm of the tango, this dance that demands passion to not miss the steps.

‘Siempre que te pregunto que, cuando, como y donde, tu siempre me respondes quizas, quizas, quizas’... (Whenever I ask you what, when, how and where, you always answer: who knows, who knows, who knows?...)

Because there are hugs and hugs. And above all there is what we do not know about the hugs that we deny and from which we deviate. Not to mention those from which we hide and those we have promised, but have not given. And since there are no simulated hugs, there is no mercy when we unwillingly embrace someone. Especially because the true hugs are forever tattooed on our chest and soul. They are engraved in incandescent ink which seems to be transparent at first sight, but at this moment is lit, because it is 6.00 pm, traffic is jammed at Avenida Paulista, and on the radio, Jota Quest sings. He sings and I chorus in honor of all the hugs that I will still give and receive: the best place in the world is in a hug’.

(*) Jota Quest is a Brazilian composer and singer.

sábado, 17 de junho de 2017

De volta pra casa / Back home

Um lar não é necessariamente uma casa, mas qualquer coisa que nos faça sentir menos sós. A definição é proferida pelo detetive Julien Batiste, personagem da minissérie ‘The Missing’ (o desaparecimento (*), para consolar um pai que busca obsessivamente o paradeiro do filho, misteriosamente desaparecido há oito anos. É dita na tentativa de convencer esse pai, devastado pela trágica perda, a voltar pra casa e seguir em frente.  Mas ele, o pai desalentado, resiste. E pergunta:

“Casa? Que casa?

Independente do contexto da ficção, a pergunta e a definição me emocionam; me fazem refletir sobre esse lugar a que dou o nome de lar/casa e para onde sempre volto, depois de encarar uma empreitada. Essa referência de acolhimento, onde me recolho para recarregar as baterias e ganhar ânimo a fim de encarar a próxima etapa – seja ela qual for. Esse espaço quentinho e único que, um dia entendi: bastava existir dentro de mim, para que eu não me tornasse uma alma penada vagando pelo mundo.

Levei um tempo para chegar aí. Para compreender que esse lar sem fundações físicas reune um pouco de todas as casas em que já vivi. Guarda a intimidade do meu quarto de menina, no apartamento de Petrópolis, e o gosto de aventura saboreado tantas vezes, durante a infância, no quintal da casa da minha tia-madrinha, Dudu, em Jacarepaguá. Tem o cheiro de pão-de-ló saído do forno que minha mãe, até bem pouco tempo, assava todos os sábados, e o hálito da maresia de Barra de São João, onde, na adolescência e na casa da mesma tia, passei tantas férias de verão.  Conserva a sensação de ser sempre bem-vinda que eu experimentava todas as vezes (e eram muitas) em que ia à casa da Patrícia Hausberg, minha primeira (e durante muito tempo a única) amiga no Rio de Janeiro. Traz o aconchego da cozinha da Bel Tostes, amiga de época mais tardia, mas que por ser do interior como eu, sempre apreciou boa prosa regada à café com queijo minas. Preserva o silêncio da sala em que troquei tantas confidências com a Sandra Cohen,  colega do período em que trabalhei em redação, que virou amiga-quase-irmã e que acompanhei em diversas casas.

Essa casa metafísica em que hoje habito guarda, tem, conserva, traz e preserva tudo o que preciso carregar comigo – fundações, teto, mesa farta, leito aquecido,  e até um copo de leite morno adoçado com mel para acalentar sonhos quase esquecidos. Ao longo do tempo, ela foi incorporando mais cômodos, Espaços construídos a partir de facetas desconhecidas de velhos amigos; de novas amizades que se revelaram próximas num curto período de tempo; de resíduos de amores ultrapassados; de dissabores que desbotaram com os anos, mas ainda funcionam como alarmes contra precipícios…

De tudo um pouco essa casa alimenta seus alicerces. Do beijo no olho para não ficar caolho, que recebo todas as manhãs do meu marido,  Lucillo, como forma de me desejar bom dia, ao ronronar do Onassis, gato de estimação,  que pressiona o focinho contra o meu nariz para dizer a qualquer hora: preciso e quero sua atenção! Do interfone que dispara para anunciar entregas e a chegada da diarista, ao alarme do celular que avisa, com cinco minutos de antecedência, a iminência do próximo compromisso. Ela se nutre dessas e de todas as pequenas coisas que compõem o dia a dia. E, assim, também me nutre com a certeza de que sou a própria casa. Portanto,  onde quer que eu vá, tenho sempre pra onde voltar.

(*) Exibida pelo canal de assinatura GlobosatMais, a série ‘The Missing’ pode ser acessada pelo portfolio do Net Now. 
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Home is not necessarily a house, but anything that makes us feel less alone. Detective Julien Batiste, a character in ‘The Missing’ series, gives the definition to convince a father who obsessively looks for his missing son to give up and move on. Devastated by his tragic loss, the father resists, asking:

"Home? What Home?

Regardless of this context, the question and the definition move me. They make me think about the place I call home and to where I always return. This host reference, where I pull myself together to face the next step - whatever it is. This warm and unique space that keeps me safe, because it exists inside of me, I finally understood.

It took me a while to get there. To understand that this home without physical foundations brings together a little of all the houses in which I have lived. It keeps the intimacy of my little girl's room in Petropolis's apartment, and the taste of adventure so often savored during my childhood in the backyard of my aunt-godmother Dudu's house in Jacarepaguá. It preserves the smell of bread pudding out of the oven that my mother, until very recently, baked every Saturday and the breath of the sea of ​​Barra de São João, where, in adolescence and in the house of the same aunt, I spent so many summer vacations. It retains the feeling of being welcome that I experienced every time (and there were many) when I went Patricia Hausberg’s place, my first (and for a long time the only) friend in Rio de Janeiro. It brings the warmth of Bel Tostes' cuisine, a friend of later times, but who, being from the interior like me, always enjoyed good prose watered with coffee with cheese. It preserves the silence of the room in which I exchanged so many confidences with Sandra Cohen, a newsroom colleague, who became a friend-almost-sister and whom I accompanied in several houses.

This metaphysical home in which I live keeps, has, brings and preserves everything I need to carry with me - foundations, ceiling, meals, warm bed, and even a glass of warm milk sweetened with honey to cherish almost forgotten dreams. Over time, it has been incorporating more rooms, Spaces built from unknown facets of old friends; from new friendships that have revealed themselves in a short time; from residues of outdated loves; from disappointments that have faded over the years, but still act as alarms against precipices...


This home feeds its foundations from everything. From the kiss on the eye that I receive every morning from my husband, Lucillo, as a way to wish me good morning, to the pet cat Onassis’ purring, who presses the muzzle against my nose to say at any time: I need and want your attention! From the bell that rings to announce deliveries and the cleaning lady arrival, to the cell phone alarm that warns me, five minutes in advance, about the next appointment. This home feeds itself on these and all the little things that make up the day to day. And so, it nourishes me with the certainty that I am the house itself and wherever I go I will always have a place to come back.

sábado, 10 de junho de 2017

Entre o essencial e o supérfluo / Between the essential and the superfluous

Eu tinha apenas seis anos quando me pediram em namoro pela primeira vez. E antes que vocês, leitores, se precipitem em me chamar de precoce, devo esclarecer: a proposta veio de um coleguinha de escola, um ano mais velho do que eu, literalmente empurrado pelo pai, que --  este sim precocemente -- já se preocupava com o que julgava ser a ‘excessiva timidez’ do filho diante do sexo oposto. Não lembro o nome do menino, nem se eu sabia exatamente o que significava namorar, mas  guardo a imagem nítida dele, ancorado nas pernas do pai, me estendendo um punhado de margaridas, enquanto proferia com voz quase inaudível a fatídica pergunta: quer namorar comigo?

Luc e eu, eternos namorados.   Foto de Antonio Lisboa
Ele estava tão apavorado, que mal conseguia segurar as flores. Me olhava sem piscar e respirava ofegante, enquanto o pai – Ah! O pai! – em tom ansioso, lhe dava voz de comando: “anda menino, entrega logo essas flores!” “Senta logo ao lado dela!” “Pergunta se ela quer tomar um sorvete com você!...”  Soava tão peremptório, que eu mesmo -- disso me lembro bem -- me vi intimidada. E já estava quase aceitando flores, pedido em namoro, sorvete, sem saber se realmente os queria, quando minha mãe surgiu em meu socorro. Não sei quanto tempo ela estava ali acompanhando a cena. Só sei que chegou bem a tempo de me dar a mão,  me ajudar a segurar as margaridas, que a essa altura já roçavam meu queixo, abrir espaço para que eu pudesse agradecê-las ao menino e rosnar alguma coisa que não consegui entender àquele pai. O suficiente para detê-lo, contê-lo e afastá-lo. D. Lydia sempre se revelou uma leoa quando se tratava de defender a sua cria.

Lembro que depois desse epsódio esbarrei umas três vezes com o menino na escola. Em todas, ele mal me olhou, não proferiu qualquer som,  enrubeceu como um tomate e correu para o lado oposto do pátio. Logo depois, saiu do colégio. Nunca me deu tempo para lhe dizer que, sim, eu aceitava namorar com ele. Se namorar signifcava aceitar suas flores, sentar ao seu lado na hora do recreio e de vez em quando tomar um sorvete juntos apreciando a paisagem, sim, eu queria namorar.  Claro! Com uma condição: que aquele seu pai ansioso e enxerido não se metesse na nossa vida. Seria assim, ou estaria tudo acabado.

Acabou. Acabou bem antes de começar. Como depois, ao longo dos anos, eu me daria conta:  acabariam tantos outros namoros que, por questões que estão além da timidez desmedida e da vulnerabilidade às ansiedades paternas, tanto prometeram, mas nada cumpriram. Tantas outras promessas abortadas, por conta dos temores que trasformam encontros em desencontros incortonáveis – o medo da falha, da falta, da entrega. Tantas possibilidades extirpadas pela necessidade de se afirmar e existir sozinho, apesar de precisar estar com o outro, viver com o outro, querer  e amar o outro. Tantas encruzilhadaa ultrapassadas sem checar todos os lados da via, porque valia mais o arrepio de andar em alta velocidade, do que a emoção de trafegar e,  ao mesmo tempo,  apreciar a paisagem.

São quase cinco décadas de namoros. Cinquenta anos dos quais os últimos quinze -- no meu atual e definitivo casamento -- têm me ensinado tudo (ou quase) o que não é necessário para um relacionamento perdurar, depois que vence a barreira do, sim, eu quero te namorar. Me concentro  no que é descartável, por ter aprendido, muitas vezes a duras penas, que, nas questões de afeto, é sempre mais fácil focar equivocadamente naquilo  que  é precindível, em vez de prestar atenção ao que é essencial.  E se o essencial é invisível aos olhos e só se pode ver com o coração, me permito o cliché de citar O Pequeno Príncipe (apesar dos devaneios das misses que o banalizaram nos concursos das décadas de 60, é um grande livro) e me atrevo a articular o que, para mim, é a essência para tornar um relacionamento duradouro: abrir mão da razão – quero dizer: de ter sempre razão; reconhecer os defeitos do outro e amá-los acima das suas qualidades; acordar todos os dias perguntando: você aceita namorar comigo?

Então, viva o dia dos namorados!

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I was only six when I was first asked date someone. And before you, readers, hurry up in calling me precocious, I must clarify: the proposal came from a schoolboy, a year older than me, literally pushed by his father, who was early worried about the son’s 'excessive shyness' in the face of the opposite sex. I do not remember the boy's name, nor did I know exactly what it meant to date, but I keep the sharp image of him, anchored in his father's legs, holding out a handful of daisies, as he uttered in an almost inaudible voice the fateful question: Do you want to date me? ?

He was so scared he could barely hold the flowers. He looked at me without blinking and breathing heavily, while his father - Ah! The father! – told him in an anxious and mandatory voice, "Go boy, give her those flowers!" "Sit down next to her!" "Ask if she wants to have an ice cream with you!" He sounded so peremptory that even me, I felt intimidated. So that I was almost accepting flowers, dates, ice cream, not knowing if I really wanted them, when my mother came to my rescue. I do not know how long she had been there following the scene. All I know is that she came just in time to hold my hand, help me hold the daisies, make room for me to thank the boy for the flowers and growl something to that father. I could not understand what was it, but know it was enough to spot and push him away.

I remember that after that episode I bumped into the boy at school about three times. In all, he hardly looked at me, uttered no sound, blushed like a tomato, and ran to the opposite side of the courtyard. Soon after, he left the school. He never gave me the chance to tell him that, yes, I agreed to date him. If dating meant accepting his flowers, sitting next to him at recess and from time to time have an ice cream together enjoying the landscape, yes, I wanted to date. Of course! With one condition: that his anxious father did not get into our life. It would be like this, or it would be over.

It ended up. It ended well before it started. In the same way, over the years, so many other relationships would end, regardless of their promises. So many promises that failed because of the fear that makes great encounters impossible  - the fear of failure, of vulnerability, of surrender. So many possibilities extirpated by the need to prove self-sufficiency, despite needing to be with the other, to live with and love the other. So many crossroads that have been overlooked without checking all sides, because the passion for high-speed was stronger than the thrill of traveling and enjoying the scenery.

It has been almost five decades of dating. Fifty years of which the last fifteen - in my current and definitive marriage - have taught me what is not necessary for a relationship to last after it overcomes the yes barrier, I want to date you. I concentrate on what is disposable, because I have learned – sometimes not through easy ways -- that in matters of affection, it is always easier to mistakenly focus on what is not necessary than on what is really essential. And if the essential is invisible to the eyes and can only be seen with the heart, I allow myself the cliché of quoting The Little Prince and dare to articulate what, for me, is the essence of a lasting relationship: to give up the premises of always being right; to recognize the other’s faults and love them above his/her qualities; wake up every day asking: do you want to date me?

So, Hooray Valentine's Day! (*)


(*) Differently from the rest of the world, Valentine’s Day is celebrated in Brazil on June 12.

sábado, 3 de junho de 2017

Sobre micos e bisavós / About bloopers and great-grandparents

Ela não usava email, não tinha perfil no Facebook e raramente navegava pela Web. Não fosse o smartphone que ganhou de um dos bisnetos num dia das mães, há três anos, a vida da minha leitora Laura Dionísio Albuquerque, 84 anos, continuaria totalmente analógica.  Continuaria. E só não continuou por causa da persistência do mesmo bisneto que a presenteou. Vendo que a bisa não substituia o celular tradicional que já tinha pelo novo,  ele passou  duas semanas indo diariamente a sua casa, para formatar o aparelho com todos os aplicativos que, achava, ela precisaria; ah, sim! E para ensiná-la a usá-los.  

“Ele se empenhou tanto, que fiquei sem graça de dizer que eu só precisava de celular para falar”, conta ela pelo Skype, facilidade que passou a conhecer através da “maratona de treinamento” do bisneto. Maratona que a deixou extenuada por quase um mês, pois além de ter que memorizar para que serviam todas aquelas “janelinhas” na tela do aparelho, precisava aprender rapidamente a “operá-las”. Até porque, diligente, o bisneto volta e meia e sem prévio aviso testava o seu progresso.

“Foi num desses sustos que aprendi a usar o zaaap”,  descreve ela, ao referir-se ao whatsapp (aplicativo que possibilita a troca de mensagens instantâneas --  traduzindo para os leitores que por acaso ainda não o conheçam). E continua:

“Eu estava num restaurante perto de casa, onde costumo almoçar, e, de repente, comecei a ouvir aquele som de sirene vindo da minha bolsa. Peguei o celular e vi a janelinha do zaaaaap piscando pra mim. Deduzi que o som viesse dali e a toquei. Deparei com a foto do meu bisneto sorrindo e o recadinho dizendo: ‘nada não bisa, só queria ter certeza que você estava aí’.  Me derreti toda, né?! E tratei logo de achar o jeito pra responder: ‘sim, estou aqui e usando o zaaap’. E ainda coloquei uma emoji, que no dia anterior tinha aprendido a usar. No que a família ficou sabendo que eu já sabia pilotar o zaaap, foi um tal de zap pra cá e pra lá, que minha primeira providência foi convocar o bisneto para trocar o alerta de sirene por algo menos alarmante. Ele ficou todo prosa”.

Prosa e animado. Tão animado, que a desafiou para uma série de atividades on line, como: jogar dominó e paciência com adversários virtuais; convocar uma reunião familiar e a realizar via skype; fazer um curso de culinária tailandesa; voltar a estudar francês…  Laura passou “com louvor” por todas essas provas e aceitou muitas outras propostas pelo bisneto e demais membros da família. Na verdade, a experiência tem sido tão enriquecedora, que ela mesmo passou a desafiar-se:  todo mês se propõe a fazer alguma coisa que nunca fez antes.

“Com essa história do celular, me dei conta que, quando você começa a se perguntar quando foi a última vez que fez alguma coisa pela primeira vez, é sinal que a sua vida está caindo na mesmice. A ficha realmente caiu quando me vi diante da concentração de primeiras vezes nesse smartphone. OK, eu já tinha passado dos oitenta, mas e daí?  Se esse é o caminho para manter a juventude independente da idade, quero percorrê-lo”, afirma.

Entrar em contato com o 2xTrinta e me contar essa história, para ver se eu me interessaria em publicá-la, foi o desafio que ela se impôs para este junho que mal começa. Uma prova que eu consideraria até fácil, mas que ela explica não ser tão simples, uma vez que, deduz: eu iria pedir uma foto sua e. pelo menos, o nome do seu bisneto, e ela não pode oferecer nenhuma das duas coisas, porque ele, o bisneto, não quer “pagar mico nas redes”.

Realmente, eu adoraria ilustrar esse texto com a foto dessa dupla que protagonizou/za história tão especial. Porém, se mantê-la sem rostos é a condição  para compartilhar a experiência de uma octogenária que  descobriu a fonte da juventude a partir de um smartphone, topo pagar esse mico. Afinal, quanto tempo faz mesmo que não pago um mico?

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She was not an email user, did not have a Facebook profile and rarely navigated through the web. My reader Laura Dionísio Albuquerque, 84 years old, would still living an analogical life if one of her great-grandchildren had not given her a smartphone as Mothers’day gift three years ago. More than that, he enabled her to use it.

"He worked so hard to make that possible that I was embarrassed to say I just needed a cell phone to talk through," she says over a Skype, a facility she came to know through the same great-grandson’s "training marathon." A marathon that left her exhausted for almost a month, because in addition to having to memorize all the "little windows" on the device screen , she had to learn quickly " how to operate them". Without previous notice,  the great-grandson kept diligently checking her progress.

"It was through one of these not scheduled checking points that I learned how to use zaaap," she says, referring to whatsapp (an instant messaging application - explanation for readers who do not happen to know it yet). And she keeps going:

"I was in a restaurant near the house, where I usually have lunch, and then I suddenly heard the siren sound coming from my bag. I picked up the cell phone and saw the zaaaaap's window winking at me. I concluded I had to touch it and when I did, I got the picture of my great-grandson grinning with this message: “hey great-grandma, I just wanted to make sure you were there.'  With my heart warmed, I helped to find the way to respond: 'Yes, I'm here and using zaaap' As the rest of the family learned that I already knew how to use whatsapp, I found myself in the middle of a zap festival.  It was so intense, that I asked my great-grandson to change the siren alert for something less alarming. He got so proud of me. "

Proud and excited So excited, he challenged her to a series of online activities, such as: playing dominoes and solitaire with virtual opponents; holding a family meeting via Skype; taking a Thai cooking course; learning French ... Laura passed "with praise" for all of them and accepted many other challenges proposed by the great-grandson and other members of the family. In fact, the experience has been so enriching that she decided to challenge herself to do something she has never done before every month.

"With this cell phone story, I realized that when you begin to wonder when you last did something for the first time, it is a sign that your life is becoming boring. The insight came when I saw myself in front of the concentration of first times in this smartphone. Okay, I was already over eighty, but so what? If I have found how to be young despite of my age, I have to take this chance, haven’t I?". She says.

Contacting 2xTrinta and telling me her story, to see if I'd be interested in posting it, was the challenge she set for this June that just started. A proof that I would even consider easy, but which she explains is not so simple, since, she deduces: I would ask for a photo and, at least, his great-grandson’s name, and she can not offer either of them, because he, the great-grandson, does not want to "look like a blooper in the social network."


Really, I would love to illustrate this text with the photo of this duo who starred in such a special story. However, if keeping it without faces is the condition to share the experience of an octogenarian who found how to keep herself young from the use of a smartphone, I agree in making myself a blooper. After all, how long has it been since I made it for the first time?